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domingo, 28 de março de 2010

RELIGIÃO DA HUMANIDADE - (Zero Hora - 02/03/2010)

Templo sem culto nem deus

Como faz todos os domingos, o guardião do templo positivista de Porto Alegre, Afrânio Capelli (foto ao lado), 80 anos, deu início aos trabalhos às 10h de 28 de fevereiro. Puxou a cadeira para o meio da nave, junto aos visitantes, que naquele momento eram três, e seu aprendiz, Erlon Jacques de Oliveira. Enquanto explanava sobre a doutrina de Auguste Comte, mais adeptos iam chegando. Uma hora depois, havia mais de uma dezena.

– Temos a nossa religião, e queremos que você invente a sua. Nem católica, nem israelita, nem muçulmana. Você tem uma roseira branca muito bonita em casa? Pode ser a “religião da rosa branca” – discursa Capelli.

Construída entre 1911 e 1928 e com a fachada renovada, a capela positivista da João Pessoa não recebe mais cultos. Sequer tem um deus, um padre, um pastor ou um frei. Hoje, o guardião é um palestrante de discussões sobre sociologia, política e, claro, religião.

– Não temos mais culto porque não há mais membros ortodoxos. E seria muito difícil para uma sociedade sem muita instrução compreender uma religião que não tem um deus criador.

Santos também não há. A não ser que se considere a santificação da mulher que tem filhos, pois assim ela é considerada pelos positivistas. Pelas paredes, palavras delimitam a ideologia, bem distinta de mensagens religiosas, como arquitetura, escultura, pintura, música e poesia. Quadros celebram positivistas destacados, como Raimundo Teixeira Mendes e Miguel Lemos, e placas indicam os 14 meses da doutrina, diferentes dos 12 conhecidos: César, Arquimedes e Aristóteles são alguns deles.

No porão há uma biblioteca com livros raros, com destaque para as obras que embasaram Comte na construção do positivismo. Há também algumas relíquias. Ali, Borges de Medeiros e José Montaury participavam de reuniões secretas, quando o doutrina teve poder no Brasil.

Hoje, a sala principal tem relíquias, um espaço para oficinas e um depósito de documentos. Para 2010, o objetivo é realizar diversos cursos gratuitos no interior do templo.

Guardião de macacão

Capelli não se aposentou, mesmo podendo. Por ter saúde, não quer deixar o trabalho no bairro Sarandi nem receber dinheiro do governo – fonte de recursos repudiada pelos positivistas. Na indústria dele, veste diariamente seu macacão. Repudia o conflito de classes, mas rejeita o socialismo.

– Se um trabalhador faz cinco cadeiras e outro, sete, pagar o mesmo para os dois vai desestimular o que produz mais.

Obrigatoriedade, não

No início do século 20, os positivistas entraram em choque com a prefeitura quando esta iniciou uma campanha de vacinação obrigatória. Houve forte repúdio dos seguidores da doutrina. Para informar à população sobre seus direitos, Teixeira Mendes escreveu um texto publicado em formato de livreto, em 1904, no qual o Apostolado Positivista do Brasil criticava o projeto contra a varíola. A prefeitura proibiu o texto e mandou recolher a publicação.

O esvaziamento da guerra

Foi a II Guerra Mundial que esvaziou a capela. Com muitos membros italianos e alemães e seus idiomas incentivados, foram censurados por uma sociedade que demonizava a cultura dos rivais na guerra. O templo reabriu nos anos 1980. Desde então, Capelli é o responsável pela unidade da capital gaúcha, mas admite:

– Hoje, o positivismo não tem influência nenhuma.

andre.mags@zerohora.com.br

ANDRÉ MAGS
Saiba mais
O positivismo é um sistema filosófico erigido pelo francês Auguste Comte (1798-1857) com ênfase nas virtudes do modernismo e da industrialização. Com base no estudo das leis naturais, como as da física, o positivismo pleiteava uma união universal da humanidade no momento em que as sociedades evoluíssem a um estágio superior de conhecimento científico – o que aboliria a necessidade de Deus, substituído pela fraternidade universal entre os homens, pregada pela Religião da Humanidade.